Já dedicamos dois posts sobre o tema da vaidade, desapego, vazio interior e necessidade do Divino. Nesses artigos, refletimos sobre o quanto a vida é efêmera e da necessidade de preencher com Deus o nosso vazio existencial. Ainda em torno do assunto, temos uma realidade gritante de nossos dias, que está no número de salões de beleza, centros de estética, produtos voltados para o combate ao envelhecimento, aplicações de botox, ácidos hialurônico e tantos outros procedimentos que visam a melhora da aparência ou rejuvenescimento estético. Na contramão dessa abundância de recursos voltados para o embelezamento, tem-se a visão do ocaso da vida ao se visitar uma clínica dedicada a idosos. Essas casas abrigam anciãos com sérios problemas de saúde, depressão e outros problemas de ordem psíquica, tornando o ambiente assaz melancólico. Muitos não dizem coisa com coisa, de maneira que é preciso esforçar-se para ver algum sentido em suas palavras. Vê-se portadores de Alzheimer que o tempo todo perguntam de suas famílias, afirmando estarem apenas esperando seus filhos para ir para casa. De fato, alguns desses idosos não veem seus parentes há tempos, acentuando a sensação de abandono. Muitos padecem de problemas neurodegenerativos, o que confere uma nota ainda mais desoladora ao lugar.
Tudo ali é muito rotineiro, quase sem vida e movimento, de forma que lhes fazer uma visita levando-lhes algo é uma verdadeira obra de caridade. Entretanto, é impossível ver aquela gente toda no fim de sua existência terrena e não refletir a respeito de o quanto as pessoas hoje dão demasiado valor à beleza física, à saúde e ao dinheiro.
Quando comparamos o mundo moderno ao antigo, sobretudo das civilizações greco-romanas, nos deparamos com inúmeras semelhanças, sobretudo no tocante ao modo pagão de se viver. Alguns intelectuais e críticos católicos acusam o modus vivendi moderno de neopaganismo, e com uma boa parcela de razão, senão com toda razão…
No mesmo sentido, o Papa São João Paulo II, em seus documentos e discursos, afirmou várias vezes que a civilização cristã vive um secularismo sem precedentes. “Secularismo”, para quem desconhece o termo, significa uma tendência de nossa sociedade rumo a uma vida laica, sem fé e religião.
Os antigos pagãos cultuavam bios e mamom (vida e dinheiro) de forma excessiva e muito semelhante à idolatria do mundo moderno pela beleza física e enriquecimento. Por isso entendemos o porquê da advertência de Cristo aos judeus, que eram frequentemente influenciados pelos costumes gentios: “Quem quiser, pois, salvar sua vida, perdê-la-á.” (Mc 8, 35). E em outra ocasião: “Não podeis servir a Deus e ao dinheiro.” (Lc 16, 13).
Em nossas cidades pululam salões de beleza, clínicas de estética e cirurgia plástica; academias e lojas com roupas, sapatos e toda sorte de adereços para tratar e ornar o nosso corpo; porém os verdadeiros salões de beleza espiritual, as igrejas, são cada vez menos procurados. As vocações religiosas, sobretudo na Europa, estão minguando, quase desaparecendo. Vive-se uma demasiada preocupação com a vida terrena, e esquece-se da beleza espiritual, que é a forma adequada de nos apresentarmos a Deus no dia do nosso juízo particular.
Nesse sentindo, é interessante avaliar o que dizem senhoras idosas ao falar, repetidamente, de o quanto eram bonitas e atraentes; de o quanto eram assediadas por belos e ricos candidatos… O mesmo quanto aos idosos, que recordam com bom humor e saudades dos tempos de juventude, onde o vigor físico se misturava a aventuras amorosas, em jogos esportivos e festas. Onde foram parar toda aquela vaidade, atratividade e beleza? Não lhes resta mais nada… Da vida, só lhes resta a memória dos tempos de mocidade, mais alguns anos, meses ou dias… Sic transit gloria mundi! “Assim passa a glória do mundo!”.
Um bom motivo para dar mais valor à vida sobrenatural, que nos mantêm ligados a Deus e nos serve de escada segura para o Céu.
Marcos A. Fiorito
Teólogo e historiador
(Autoriza-se reprodução do artigo com citação da fonte e autor.)
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